No dia 31 de Março, o Rio sediou um grande evento de superação. O Circuito AdaptSurf trouxe uma demanda que ainda o mercado turístico não trabalha com total atenção.O tempo nublado e as ondas de tamanho perfeito já deixam o mar crowdeado na Praia da Macumba, no Rio de Janeiro. De repente, chama a atenção na areia uma galera estendendo esteiras de nylon, cadeiras anfíbias (especiais para a água) e pranchas com alça. Criado em 2007 por Luiz Phelipe e Luana Nobre e Henrique Saraiva, o Instituto Adaptação e Surf realizou o Circuito AdaptSurf, primeiro circuito de surf para pessoas com deficiência. As regras são simples: dois alunos entram na água acompanhados de dois surfistas voluntários (para ajudá-los a entrar nas ondas) e disputam baterias de 20 minutos. Como o principal objetivo é estimular a integração social e a gana de vencer seus próprios limites, não há eliminações. As notas são somadas para o ranking anual, e o vencedor do circuito será o que acumular mais pontos até o final do circuito, em dezembro.
A primeira etapa teve 16 inscritos. Apesar não estimularem a competitividade, Luiz Phelipe, Luana e Henrique concordam que a melhor onda do dia foi de Monique de Oliveira, 24 anos. Com dificuldades congênitas de locomoção e fala, ela surfa deitada, mas consegue se equilibrar e direcionar o peso para dropar as ondas. “Quando entro no mar esqueço de tudo. Sou uma surfista de alma”, disse depois de comemorar suas manobras.
As mulheres continuaram se destacando nas baterias. Defendendo o título – ela foi campeã do circuito em 2011 – estava Fernanda Tolomei, 22 anos, estudante de psicologia. Fernanda nasceu sem a mão esquerda, e com a ajuda do surf aprimora suas habilidades motoras, surpreendendo a família e os amigos também com um upgrade na alegria. “Meu ídolo é a Bethany Hamilton. A deficiência fez dela uma mulher mais forte, além de ter reforçado seu amor pelo esporte”.
Eduardo Mayr, 40 anos, também tem fome de ondas. Surfista desde os 12 anos, há seis bateu com a cabeça no fundo de areia ao mergulhar de um barco em Angra e ficou tetraplégico. Depois do acidente conheceu o rugby, se tornou profissional, chegando a presidente da Associação Brasileira de Rugby em Cadeira de Rodas, cargo que ocupa atualmente. No início de 2011 se rendeu ao incentivo de amigos e voltou a pegar onda. “É engraçado, tenho mais fotos minhas na água agora do que antes do acidente. Em todas vejo meu sorriso escancarado, o que me dá ainda mais ânimo. Ganhei mais equilíbrio corporal também”, conta, ao lado dos filhos Pedro, 13, e Júlia, 8, incentivadores e pelo jeito também futuros surfistas.
Na equipe de voluntários, Renata Marcadella e Niel Terme eram os novatos. Eles vieram de Garopaba, Santa Catarina, para aprender sobre o projeto e construir um nos mesmos moldes no sul. Pode ser o primeiro passo para realizar o sonho dos criadores da ONG: ter em todas as praias do litoral brasileiro condições de acesso para deficientes. “Poder ir a praia é uma conquista inestimável para quem tem qualquer tipo de deficiência. Eu sentia que chamava a atenção pelo fato de estar de muletas, mas quando reparam que vou surfar, o olhar passa a ser de admiração”, explica Henrique, baleado na coluna em 1997, perdendo o movimento das pernas. “Na época, dominava vários esportes, e queria mesmo era voltar para o futebol. Hoje vejo que o surf me preenche. Na água todo mundo tem seu espaço”.
As próximas etapas do Circuito serão em junho, no Arpoador; em setembro, no Leblon; em dezembro, na Barra. O Instituto Reação e Surf atende todos os sábados, das 11 às 16h, no posto 2, na Barra, e aos domingos, no mesmo horário, no posto 11, no Leblon.
Esse sucesso mostra com facilidade que é possível quando a superação existe.
O Brasil será porta de entrada de vários públicos nos próximos eventos e ainda não existe nenhum trabalho de acessibilidade nas praias fluminenses.
Parabéns a todos os apoiadores, patrocinadores e principalmente aos voluntários que acreditaram na possibilidade da Superação!!!